18 março 2013

Registro LXXIII

Nessa páscoa
estarei com minha mãe.
A minha via crúcis
desembocou no mesmo lugar.
No domingo vou soltar
a coroa de espinhos
e comer com meus irmãos.
A minha ressurreição
começou bem antes,
quando desatei no choro
ao descer das nuvens.
Ô maresia querida!
Eita calor de cruz que me perpassa.
É dia de azul fantástico
e eu quero mesmo é viver!

18 fevereiro 2013

Registro LXXII


Queria agora era um poema
de cordas esticadas, fibrosas,
vermelho, adornado com flores brancas.
Por urgência de amor.
Queria era um poeminha de luzes
que acendessem uns
sentimentozinhos redondos,
moles, cremosos,
peito de mãe sugando boca de filho.

Era só uma estrofezinha,
dessas de louça branca,
infusão de ervas perfumadas
e colheres de prata.
Um poeminha com letra tremida
só porque veio desprevenido
e inacabado mas completamente
posto na mesa, na massa crua
que vai ser pão assado,
nas migalhas preciosas.

Ah se chegasse esse poema
embrulhado em papel pardo
sobre a mesa redonda
com gosto e cor de Prado florido,
saudade dissipada, paraíso contemplado.
Era um poemacorpo na entranha
enfim, aconchegado.

07 novembro 2012

Registro LXXI

A novidade é estar vivo
e ainda querer
a inflexão do tempo.
O olho d'água jorra
instantes aquosos,
frações de sopro,
respiro breve.
São novos o próximo ponto
e a letra que vem.

22 outubro 2012

Registro LXX

Dia morno na órbita dos olhos,
de azul e luz sufocados.
Uma permanência aguda,
a penitência encharcando
as rutilâncias,
sombra de mangueira,
ranço tenro de pitanga, vespa,
isca, nesga do suspiro de Deus.
A primavera saiu assim
de um vestido,
da calçada de pedras renitentes
entre viver e esperar a noite.

10 julho 2012

Registro LXIX






















A grama cercando a telha,
o caco de barro,
teus pés,
o quintal de tuas ideias.
No ponto onde parastes
boiava sombra e vidinha fresca:
_ pra quê seguir adiante?
Levantou-se e foi buscar
café no bule para sempre.

02 julho 2012

Registro LXVIII

Feito papéis no fundo das gavetas,
certos instantes
sempre reaparecem.
Fantasmas renitentes
de coisa pegajosa.
Queria dizer: oh Deus
me ajuda a queimar esses papéis!
E recebo seu olhar de chumbo
sobre minha fraqueza.
Até poder cuspir perdão
os papéis voltam, amarelos,
às gavetas.

11 junho 2012

Registro LXVII

Amar é bom.
Fruta que cresce.
Amar é bom e tece
um halo que floresce
em flores líquidas
num mar de urnas,
veloso,
abrindo as asas, bordas,
abismos carnosos.
Como quem se oferece
a estrelas pingentes
e emerge das brumas,
amar é bom
e eu tenho comigo
o vidro dos olhos
depois que explodem
todos os brilhos.